O
que iria acontecer se, de repente, nós, pessoas e coletivos, que nos definimos
como insurgentes, a partir de práticas de resistência, oposição e de luta por
democracia real, simplesmente, respondendo ao "sonho" neoconservador
de vários segmentos do poder, parássemos de protestar, de denunciar, de
questionar, de fazer oposição? Qual seria o efeito disso para a vida social?
Vocês conseguem imaginar uma greve geral invertida? Seria mais ou menos assim:
ninguém diria uma palavra sequer de contraposição a nenhuma ordem do sistema de
dominação, ninguém faria nenhum questionamento, nenhuma problematização, sempre
que houvesse alguma dúvida, perguntaríamos ao chefe e ao chefe do chefe e assim
por diante sobre como fazer e como encaminhar, anularíamos completamente o
campo de autonomia das pessoas e dos coletivos, faríamos adesão total a
qualquer ordem recebida da polícia, da justiça, dos governos, se nos dissessem
para calar, calaríamos, se nos dissessem para andar, andaríamos, se nos
dissessem para morrer, morreríamos, não questionaríamos nada, nenhuma ordem,
faríamos a obediência total e irrestrita aos preceitos emanados das
autoridades, qualquer instância que se apresentasse como instância de
autoridade seria imediatamente reconhecida e geraria nossa obediência cega,
independente de avaliações de conteúdos e méritos, avaliar seria um atributo
exclusivo da instância de autoridade social, iríamos assim todos colaborar com
a polícia denunciando toda e qualquer pessoa e coletivo que estivesse
realizando algo que parecesse fugir ou colocar em xeque a manutenção da ordem
social, não permitiríamos no cotidiano qualquer fala ou qualquer gesto que não
correspondesse aos tutoriais divulgados amplamente pelas autoridades sociais
sobre como se comportar, se vestir, caminhar e buscaríamos cumprir nos detalhes
mais ínfimos a adesão total aos tutoriais disponibilizados pelo Estado e seus
representantes sociais, faríamos um silêncio total em relação a qualquer tema
de contestação, aboliríamos os vocabulários de contestação, apagaríamos da
memória social qualquer elemento que veiculasse alguma lembrança em torno de
formas de contestação da ordem, faríamos a hierarquização das posições sociais
de acordo com os ditames, sem nenhum questionamento quanto aos critérios e à
fonte da legitimidade destes critérios. Pergunto então a vocês: como seria
viver assim? quais seriam os efeitos para a nossa existência se realizássemos
com rigor absoluto o ideal de "paz total" da ordem social, excluindo
qualquer possibilidade de desordem? Vocês conseguem imaginar que tipo de vida
teríamos, se assim agíssemos?
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